Nº. 719 – Guitarra – 05 ago 2007, p. 4

//Nº. 719 – Guitarra – 05 ago 2007, p. 4

Nº. 719 – Guitarra – 05 ago 2007, p. 4

 

Música – Nº. 719

Guitarra

Rolando de Nassáu

(Dedicado ao leitor Zélio Seraine Teles, de Brasília, DF)

Os instrumentistas de música profana estão conquistando espaço e tempo nos cultos de igrejas batistas. Primeiramente, foi o baterista Daniel Batera (ver: OJB, 05 mar 2006). Agora, o guitarrista Ramon Chrystian (ver: OJB, 15 abr 2007), que, preocupado com os aspectos técnicos do seu instrumento, desconsidera os requisitos estéticos de sua música.

No início do seu artigo para este semanário denominacional, Ramon afirma que a guitarra elétrica tem sido abandonada por equipes de louvor, devido à “falta de conhecimento por parte dos instrumentistas” e ao “preconceito que os líderes (das equipes de louvor) formaram durante anos a respeito deste instrumento”. O guitarrista acha necessária uma atuação dos professores e ministros de música, uma conscientização pelos instrumentistas e uma flexibilidade por parte dos pastores.

Para Ramon Chrystian, a guitarra elétrica é “um meio facilitador do culto”, que deve juntar-se ao violão (instrumento harmônico, melódico e percussivo), à bateria (instrumento percussivo), ao baixo elétrico e ao piano, em apoio à equipe de louvor. O guitarrista reconhece que o piano é muito completo (“se tocado sozinho, pode dar conta do recado, no sentido de conduzir a música”) e que a guitarra elétrica pode agredir a música; por isso, deve ser inserida na equipe de louvor “com muito bom senso” e para “causar emoção nas pessoas”.

Observa que é aceitável o uso da “overdrive” (“Vineyard”) e da distorção (“Oficina G3”). Conclui que esse tipo de música será uma bênção.

A guitarra elétrica, na atualidade construída para amplificar eletronicamente o som do violão, é usada, desde a década de 30, pelos músicos de “jazz” e de “rock”. Charlie Chrystian (será que Ramon adotou esse nome?) foi o primeiro guitarrista da história do “jazz”; ele descobriu uma técnica de toque para a guitarra eletrificada, que passou a ter a agilidade de um instrumento de sopro. Em 1965, Bob Dylan trocou o violão pela guitarra. Jimi Hendrix foi o expoente da guitarra elétrica no “rock”; o instrumento atingiu o maior volume de som. Milhares de jovens elegeram Hendrix como seu ídolo e aderiram à guitarra elétrica para tocar música profana.

Por que os jovens bateristas e guitarristas “adoram” seus instrumentos? Principalmente porque a música por eles produzida é “para os olhos”, é “espetáculo”, é uma “encenação”, e porque os músicos são “as estrelas do show” (ver: Jean-Robert Masson, “Pour une sociologie du jazz – Anatomie du spectacle”. Paris: Les Cahiers du Jazz, 1961). Por isso, numa equipe de louvor, não descartam a utilização de alguns recursos cênicos, mesmo durante o culto no templo. Tão importante quanto a execução musical é a “performance” cênica. O interesse é visual, sem preocupação com a transmissão de alguma mensagem. Para o “rock”, a imagem é quase tudo (revista ‘VEJA”, 16 maio 07, pp. 112-114). Os guitarristas não estão muito preocupados com o texto que o vocalista está cantando.

O abandono da guitarra seria um bom começo para o expurgo da música instrumental em nossas igrejas. Também seria muito bom se os cursos de música (que deixaram de ser dedicados à música sacra) nos seminários e nas faculdades teológicas suprimissem o ensino desse instrumento; que os instrumentistas tivessem consciência do prejuízo que causam à reverência no culto; e que os pastores não fossem flexíveis aos caprichos de bateristas e guitarristas.

Se o piano é um instrumento “muito completo”, porque não deixá-lo sozinho no acompanhamento do canto vocal e congregacional? Se a guitarra pode agredir a música do culto, porque não evitá-la?

É aceitável a distorção sonora produzida pela “Oficina G3”, o barulho sustentado pela “Gospel Records”, gravadora da Igreja “Renascer” (apóstolo Estevam Hernandez)? Teremos oficinas do barulho em nossas igrejas? Ou a “overdrive” da música divulgada pelo Movimento “Vineyard” (John Wimber)?

Talvez Ramon esteja lembrado de “Pirou”, que oferece ao guitarrista uma oportunidade de imitar Joe Pass … Na “G3”, o percussionista e o baterista fazem malabarismo rítmico. A capa do CD da “G3” exibe 42 fotografias, mas não reproduz as letras das 14 canções. O visual é mais importante do que a mensagem! (ver: OJB, 02 abr 2001).

Ramon quer com sua guitarra “causar emoção” no culto. Há pessoas que vão ao templo à procura de emoções (ver: Roberto Torres Hollanda. Culto – Celebração e Devoção. Rio de Janeiro: JUERP, 2006, pp. 39-40, 118-120); querem oportunidades de diversão, durante a mensagem pastoral e as outras partes do culto; querem tornar-se diferentes, para afastar-se da realidade; querem ficar alegres, para sentir-se satisfeitos ao final do culto. A guitarra, instrumento apropriado à música de entretenimento, pode inclusive provocar nos assistentes uma expressão corporal ofensiva à dignidade do culto.

Temos sérias dúvidas se a guitarra é uma bênção. Ramon Chrystian pode ter preparo técnico, mas seu talento foi mal orientado. Quem pagará o tributo? A música de culto. A falta de sensibilidade é sempre danosa.

Em 2001 já escrevíamos que, o que os guitarristas tocam e o que o “público” ouve, é mero entretenimento.

 

(Publicado em “O Jornal Batista”, 05 ago 2007, p. 4).

 

2018-02-21T14:20:11+00:00 By |Instrumentos musicais|