Nº. 675 – A Terceira Onda – 04 jan 2004, p. 4

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Nº. 675 – A Terceira Onda – 04 jan 2004, p. 4

 

Música – Nº. 675

A terceira onda

Rolando de Nassáu

Em matéria de teologia, eclesiologia, canto e música, os Batistas no Brasil formam uma denominação periférica em relação aos Batistas no sul dos Estados Unidos da América. No tocante ao culto, não podemos ainda nem sonhar com a emancipação teológica, eclesiológica, hinódica e musical.

Os Batistas no Brasil têm passado por crises na teoria e na prática de seu culto. Cada crise é antecipada e acompanhada por uma onda de aculturação. As crises têm contribuído para a ambigüidade cultural da Denominação no Brasil.

O laxismo dos líderes nativos tem deixado a forma do culto batista sujeita a variações e novidades. A massificação das congregações atualmente facilita a percepção de que o culto pode ultrapassar os limites do templo e do sagrado.

Disso resulta a profanação do templo, a vulgarização do culto, o empobrecimento da pregação, a falsificação da adoração e a banalização do louvor. Tudo isso se resume num desvio da doutrina legada pelos pioneiros da obra batista.

Que tipo de culto estão os Batistas no Brasil praticando? Certamente, não é o mesmo dos primórdios.

Passados os anos da implantação das primeiras igrejas (1871-1900), a fundação dos seminários no Recife e no Rio de Janeiro permitiu a imposição de diretrizes para os cultos daquelas igrejas, baseadas em princípios teológicos e eclesiológicos. Surgiu, então, a primeira crise, motivada pela exigência de implantação de uma tradição da cultura batista norte-americana. Aquelas diretrizes confirmavam um processo, quase sempre de imposição cultural, às vezes de interpenetração de culturas. E os brasileiros se acomodavam.

No início do século 20, a Primeira Onda inculturadora modelou o culto batista através dos ensinos dos teólogos Mullins, Tribble, Broadus e Langston, dos professores Z.C.Taylor, J.J.Taylor, A.R.Crabtree e S.L.Watson e dos eclesiólogos H.H.Muirhead e W.C.Taylor, e por meio dos hinos de S.L.Ginsburg e W.E.Entzminger. Foram estes batistas norte-americanos que ditaram, durante quase 70 anos (1900-1969), o que deveriam professar e cantar os Batistas no Brasil. A teologia, a eclesiologia, o canto e a música batista no Brasil receberam desses gênios um poderoso influxo. Embora procedentes de vários hinários evangélicos, as letras e as músicas do “Cantor Cristão” representavam, em grande parte, a expressão preponderante da fé e da doutrina batistas. Ginsburg e Entzminger não procuraram analisar a cultura do povo brasileiro quando iniciaram uma hinografia em língua portuguesa para os novos convertidos; não tomaram conhecimento dos vários estilos musicais nativos; apenas transplantaram a hinodia anglo-americana.

Mas, por volta da década de 70, surgiu a Segunda Onda, quando aconteceram variações na rígida forma de culto batista. Teriam atuado o teólogo John Landers Sr., o eclesiólogo Glendon Grober, os professores Broadus David Hale, Richard Plampin, Thomas Robuck, William Viser e Byron Harbin, os músicos Fred Spann, Wyatt Parker, James Stanley Moore, William Ferguson, David Hodges, Ralph Manuel e Ronnie Parker? Presumivelmente, seriam estes que nos seminários dariam as novas diretrizes teóricas para o culto batista. Entretanto, sua influência não durou nem 20 anos.

Na época, começaram a ser aproveitados hinos de hinógrafos da “New Generation” (ver: OJB, 15 out e 17 dez 78) , encenados “musical shows” (nos quais o mais importante era o aspecto visual), e amealhados hinos de poetas e compositores brasileiros para integrarem o HCC. Parece que a revista “Louvor” e outras publicações da JUERP não conseguiram deter, na década de 90, a avalanche de música espúria, inclusive estrangeira. A clonagem produziu música evangélica estereotipada. As escolas de música sacra dos seminários foram perdendo suas características primordiais, enquanto os festivais, a partir de 1996, iam ganhando popularidade (sic) e conseguiam diversificar o culto.

Nos últimos dez anos, em certas igrejas batistas as inovações deixaram o culto à mercê de cantores, instrumentistas e coreógrafos, com ou sem pandeiros. A Segunda Ondadescaracterizou o culto e indistinguiu os Batistas.

Neste início do século 21, aproxima-se avassaladora a Terceira Onda.

O participante do culto batista tende a usar a versão bíblica, o hinário, a partitura, a gravação em áudio ou vídeo, desde que sejam os “bestsellers” dos marqueteiros. A imagem projetada num telão e a aparição de um “astro” da chamada música “gospel” transformarão o culto num espetáculo. A efusão de atitudes afetuosas fará do templo um lugar semelhante a um clube. Corpos em movimentos coreográficos tentarão dar sinais de espiritualidade. A opinião de cada crente suplantará a fé concedida por Deus e a ordem dada em Sua Palavra.

Os ícones terão participação destacada no significado do culto e das ordenanças bíblicas. O sagrado confundir-se-á com o profano. Nas congregações, será necessariamente maior a participação dos jovens. Durante o desenrolar do programa-de-auditório, antigamente chamado de culto, haverá muitas oportunidades para anunciar a venda de camisetas, adesivos, chaveiros, discos, livros e saldos da Feira do Consumidor Cristão; receberá maior atenção quem tiver maior poder aquisitivo. A Terceira Onda revelará, inclusive, mais uma vez, nossa dependência em matéria de culto.

Quem viver, verá a Terceira Onda …

(Publicado em “O Jornal Batista”, 04 jan 2004, p. 4).