S/Nº. – Tributo a Marcílio de Oliveira Filho (3) – R. T. Hollanda – 22 jan 2006, p. 14

//S/Nº. – Tributo a Marcílio de Oliveira Filho (3) – R. T. Hollanda – 22 jan 2006, p. 14

S/Nº. – Tributo a Marcílio de Oliveira Filho (3) – R. T. Hollanda – 22 jan 2006, p. 14

 

Tributo a Marcílio de Oliveira Filho (III)

Rolando de Nassáu

O ideólogo – Em 1974, discorrendo longamente sobre a música sacra no Brasil, afirmamos que, “em sua obra, Villa-Lobos foi guiado por seu instinto, seu conhecimento do folclore brasileiro e sua admiração por Johann Sebastian Bach”; em 1976, comentamos a influência estrangeira sobre a música religiosa executada no Brasil; justamente a partir de 1976, alegrou-nos o “fascinante jeito caipira” de Marcílio no aproveitamento de temas folclóricos e eruditos. Enquanto lecionava (1976-1987), Marcílio, à luz da experiência e observação, acolitadas por informações alheias, foi formando sua própria ideologia, manifestada, pela primeira vez, em 1978, numa aula magna na FTBSP; naquela ocasião, Marcílio declarou: “na área musical, vivemos uma situação diferente”; “os Batistas não evoluíram no campo musical, mais especificamente no canto congregacional”; “os hinos cantados são os mesmos (desde 1950)”; “os ligeiros acréscimos (do “Cantor Cristão”) não representam o pensamento musical nativista”; “os hinos devem ser de línguagem clara, simples e popular”; “podemos falar sobre sofrimento, fome, mas usando textos bíblicos e com base teológica, para não se tornarem os hinos simples instrumentos de subversão”; “as letras sejam fiéis à Palavra de Deus; que, apesar de modernas, não se descuidem da firmeza cristã”; “precisamos dialogar com expressões e tratamentos do domínio do homem de hoje”; “não podemos, a pretexto de modernizar os hinos, vulgarizar o tratamento para com Deus”; “uma geração inteligente, estudiosa e fiel aos princípios cristãos muito poderá dizer, com textos para os hinos brasileiros”; “infelizmente, uma prevenção muito acentuada, contra a música brasileira, pelos brasileiros”; “nossas juntas missionárias ensinam a língua, costumes e tradições dos povos, mas não mostram nada sobre a identidade musical dos povos a serem evangelizados”; “povos que recebem missionários batistas brasileiros estão novamente importando o que os brasileiros importaram”; “se cantamos hinos do “Cantor Cristão” que são folclore nos países de origem, por que não podemos também inserir em nossos cultos o elemento brasileiro?”; “serão bem aceitos hinos com os ritmos próprios da gente brasileira, como xaxado, samba-canção, marcha-rancho, baião e tantos outros sons”; “o povo que entra em nossos cultos é obrigado a familiarizar-se com expressões, ritualismo e músicas que não lhe são comuns”; “é necessário educar nossos gostos e aceitarmos muitas músicas que poderão ferir nosso gosto de burgueses de classe média”; “os músicos brasileiros sentem a indiferença das entidades convencionais”; “haverá lugar para estes hinos quando os músicos batistas brasileiros se unirem e conseguirem da CBB um reconhecimento como um órgão”; “ao completarmos 100 anos de vida batista no Brasil tenhamos, além do “Cantor Cristão”, um hinário rico em conteúdo doutrinário, poético, teológico e musical”.

O organizador – Cumprindo sua profecia de 15 de fevereiro de 1978, Marcílio e mais 34 pessoas fundaram, em Salvador (BA), em 15 de outubro de 1982, a Associação dos Músicos Batistas do Brasil (AMBB), com os objetivos de identificar e integrar os músicos (principalmente ministros e diretores de música das igrejas), ajudá-los em suas necessidades básicas e despertar os seus talentos criativos. Além de bacharel em Teologia e Música Sacra, Marcílio era graduado em Administração de Empresas; valendo-se desta capacitação profissional, durante seis anos foi presidente da AMBB, deixando-a consolidada e prestigiada. Marcílio sonhou e realizou o Primeiro Congresso da AMBB (Porto Alegre, janeiro de 1984), sempre dando notícias pormenorizadas em “O Jornal Batista”, a respeito deste e dos congressos subseqüentes, realizados em Maceió, Campo Grande, Vitória, Brasília e Fortaleza. Em Vitória, em 1987, foi organizada uma Comissão Executiva Nacional; Marcílio estava preparando a nova liderança da AMBB; graças à garra de Marcílio, a AMBB foi oficialmente reconhecida pela CBB. Nessa ocasião, a AMBB recebeu, por intermédio de um GT, a importantíssima tarefa de auxiliar a JUERP na elaboração do HCC. Marcílio, dentro do projeto “Cantem, batistas brasileiros!”, organizou sete congressos regionais de músicos.

O pastor e a ovelha – Poucos ministros de música usufruem o privilégio que Marcílio teve: consagração aos ministérios pastoral e musical. Ele reconheceu que foi consagrado “pela bondade de um concílio examinador”; “logo eu, que não pensava nisso e nem admitia a hipótese de me dedicar integralmente ao ministério!”. Ele confessou em 1987 que estudos teológicos nunca foram “as maiores paixões” de sua vida. Conversamos em Salvador, Caldas Novas, Brasília e Curitiba, tendo sempre como assuntos principais a nacionalização da música-de-igreja e a valorização dos músicos-de-igreja. Não tive oportunidade de ouvir Marcílio pregando; imagino que sua voz era melíflua, seus gestos, afáveis.

Marcílio foi pastor auxiliar de Eliseu Ximenes (Schimenes) na PIB de Santos, SP (1974/1976), de Artur Alberto de Mota Gonçalves, na IB do Ipiranga, em São Paulo, SP (1977/1989) e de Paschoal Piragine Júnior, na PIB de Curitiba, PR (1990-2005). Na presidência da AMBB, Marcílio tinha a condição excepcional de pastor e ministro de música. Por isso, tinha uma visão peculiar: “Nós, como músicos, estamos a serviço de Deus e dos pastores” (…) Não somos rivais nem queremos viver distantes dos pastores”. Sua primeira preocupação foi convidar os pastores para os congressos de músicos: “não temos os músicos entre os pastores; queremos ter os pastores entre os músicos”. Para o Congresso de Porto Alegre, convidou Werner Kaschel e David Hodges; para Maceió, Gamaliel Perruci e Artur Gonçalves. A AMBB, no final do mandato de Marcílio, criou um curso de orientação para pastores, especificamente sobre culto, música e adoração, a ser realizado no Congresso de Fortaleza.

Marcílio foi uma ovelha mansa; deverá ser exemplo para os ministros de música da atualidade. Antes de 1974, recebeu educação cristã dos pastores T.C.Bagby (que sugeriu ao menino de sete anos de idade que regesse a congregação) e Gorgônio Barbosa Alves (que incentivou o menino a fazer solos vocais no programa radiofônico da PIB de São Vicente, SP), Almir dos Santos Gonçalves (PIB da Piedade) e Aderbal Barreto da Silva (PIB de Moça Bonita, RJ). Depois de 1974, trabalhou sob a orientação de Eliseu Ximenes (Schimenes), Artur Alberto de Mota Gonçalves e Paschoal Piragine Júnior, nas áreas pastoral, de composição e magistério, e de ministério de música, respectivamente.

A propósito do “Dia do Pastor”, Marcílio escreveu três carinhosos artigos, em homenagem a esses e outros pastores que conheceu; num dos artigos destacou Artur Gonçalves como pastor amigo e incentivador. Um dos últimos desejos de Marcílio: “cada ministro auxiliar encontre no seu pastor titular essas (amizade e simpatia) e várias outras virtudes”.

Entre Marcílio e Artur houve uma ligação profunda, que os aproximou até na hora da saída para o lar celestial: Marcílio faleceu no dia 6, Artur no dia 9 de setembro de 2005.

Cremos que Marcílio de Oliveira Filho teve por lema de sua vida o que disse o Salmista: “Cantarei ao Senhor enquanto eu viver; cantarei louvores ao meu Deus enquanto eu existir” (Salmo 104:33). Certamente, mesmo depois de morto, a obra de Marcílio ainda fala. Ministros de música: imitai-lhe a fé!

(Publicado em “O Jornal Batista”, 22 jan 2006, p. 14).

 

2018-02-21T14:30:46+00:00 By |Personalidades|