Doc.JB-682
Rolando de Nassáu
Em meados do século 20, depois de mais de um século de silêncio, voltaram aos palcos de concertos os quartetos vocais, mistos ou masculinos.
Nos EUA, depois da Segunda Guerra Mundial, nas igrejas evangélicas, começando nas pentecostais e infiltrando-se nas batistas, surgiram quartetos que rivalizavam entre si, na complexidade de suas linhas vocais e na extravagância de suas interpretações. Inicialmente, o canto era sem acompanhamento instrumental; depois, alguns quartetos usaram instrumentos para criar uma base rítmica; as canções tenderam a tornar-se similares e repetitivas.
No Brasil, especialmente no Rio de Janeiro, na década de 50, destacaram-se dois quartetos vocais femininos: o “Fanny Crosby” (composto em 1948 por Lovie e Eudora Pitrowsky, Diglée de Freitas Barbosa e Dylce de Oliveira; em 1956, as duas últimas foram substituídas por Susie e Wilsênia Salles) cantava Bach e Haendel; e o “Primavera” (organizado em 1953, compunha-se de Ausma Augstroze, Elza Lakschevitz, Maria Ignez Rossi e Miridan Paranaguá Zander) cantava canções folclóricas e “negro spirituals”.
Em Brasília, o Congresso Batista das Uniões de Treinamento (CONBAT) realizou, em 08 de dezembro de 1962, o 1º. Desfile de Conjuntos Vocais (coros, pequenos conjuntos e quartetos) das Igrejas Batistas do Distrito Federal.
Depois de 40 anos de silêncio, neste início do século 21 há um crescente movimento de organização de quartetos vocais nas igrejas evangélicas no Brasil.
Num sábado à noite, em 29 de maio, realizou-se, em Brasília, o 2º. Encontro de Quartetos Masculinos, que contou com a participação de quatro quartetos, procedentes de Serra (ES), Rio Verde (GO), Brasília (DF) e Uberaba (MG), e do conjunto vocal hospedeiro.
Para um auditório repleto, cantaram peças da hinodia; para nosso desagrado, ouvimos duas peças de música profana.
O Quarteto “Manancial” (Serra, ES) cantou, a cappella, “Segurança” (HCC-417, CC-375), um “gospel hymn” (1873); com play-back, “Meu Deus e Eu”, “Eu tenho paz” e “Água viva”, canções do estilo “country gospel”.
O “Gileade” (Rio Verde, GO), sempre com pb, as canções, também no estilo “country”, “Sou feliz”, “Jonas”, “Jesus estendeu a Sua mão” e “Lar além do rio”, dando relêvo ao aspecto performático de suas apresentações.
O “Agnus” (Brasília, DF) cantou, com pb e piano, “Um vencedor” (Jáder Santos); com pb, “Preciosa graça” (Bill Gaither); com piano, “Sozinho alí caminhou” (Samuel Santos); a cappella, “Sê feliz” (Michael Blanchard); foi o quarteto mais eficiente.
O “Adoração” (Uberaba, MG), sempre com pb: “Grandioso és Tu” (Carl Boberg), “Prostrado aos Seus pés” e “He touched me” (Bill Gaither). Lamentavelmente, colocou letra religiosa na música profana de Ernest Gold, que serviu de tema ao filme “Exodus”, dirigido em 1960 por Leon Uris.
O hospedeiro, Conjunto “Shalom”, foi do “negro spiritual”, passando pela ópera, até a hinodia contemporânea, para demonstrar seu repertório eclético. O melhor número foi “Were You There?”, cantado, com acompanhamento de piano, “with deep emotion”; seguido, quanto à sobriedade na execução, dos hinos “Rude cruz” (George Bennard) e “Olhai além” (Jimmy Owens). Mais lamentável foi dar o título “Feliz serei” a uma letra profana da ópera “Tannhauser”, de Richard Wagner, escrita para coro, não para quarteto, que descreve uma cena idolátrica: a personagem ajoelha-se e reza diante da imagem da Virgem Maria … Feita uma adaptação, o “Shalom” poderia ter aproveitado um quarteto vocal da cantata “Dem Gerechten muss das Licht” (BWV-195), de J.S.Bach.
Neste Encontro ficaram bem evidentes quatro defeitos: 1) o alto volume de som produzido pelo sistema de amplificação sonora do auditório; alguns números do concerto ficaram prejudicados quanto ao entendimento das letras que estavam sendo cantadas; 2) a utilização de instrumentos musicais; basicamente, o canto de um quarteto, para ser devidamente apreciado, vale como ele canta; 3) o uso de pb por alguns dos quartetos; 4) o propósito performático de alguns dos cantores; o que se espera é que tenham individualmente afinação e potência vocal; coletivamente, coordenação, apesar da complexidade das vozes.
Neste registro, louvamos a iniciativa, renovada em 2004, tomada pelo “Shalom”, de estimular o canto dos quartetos evangélicos.
(Publicado em “O Jornal Batista”, 01 ago 2004, p. 4).