Música – Nº. 712
Roberto Torres Hollanda
(Dedicado ao leitor Nilson Dimárzio, de Volta Redonda, RJ)
À noite de uma terça-feira, 29 de agosto de 2006, na Sala “Villa-Lobos” do Teatro Nacional de Brasília, realizou-se a apresentação de Carolina Frederico com a orquestra sinfônica, regida por Sílvio Barbato, para execução do Concerto nº. 2, Opus 64, de Felix Mendelssohn (1809-1847).
Carolina Frederico é filha da pianista Denise Frederico (professora aposentada de Teoria e Percepção Musical da UFRGS) e neta do saudoso casal Loecy Cordeiro de Souza e Jeiel Ferreira de Souza. No Rio Grande do Sul estudou violino com Fredi Gerling e Marcello Gerchfeld. Em 1994, participou do 25º. Festival em Campos do Jordão (SP); em 1995, ingressou na Eastman School of Music (Rochester, NY); em 1999, no curso de mestrado da University of Alberta (Canadá); em 2004, na Canadian Chamber Orchestra; em 2005, na Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional “Cláudio Santoro” (Brasília), como um dos primeiros violinos.
A orquestra é formada por 88 instrumentistas, dos quais três são evangélicos: a violinista Carolina Frederico, o violista Billy Geier (filho do compositor Verner Geier) e a harpista Cristina Carvalho (filha do maestro Emílio de César).
Sílvio Barbato diplomou-se no Conservatório “Giuseppe Verdi” (Milão), na Academia “Chigiana” (Siena, Itália) e na universidade de Chicago (EUA). Desde 1999, é regente titular da orquestra do Theatro Municipal do Rio de Janeiro; atualmente é regente no Teatro Nacional de Brasília. Em 2005 lançou o livro “O Guaraní, canto de guerra, canto de vitória”, editado pela Biblioteca Nacional.
Um dos quatro mais importantes concertos para violino e orquestra compostos no século 19, o segundo de Mendelssohn (1844), graças à acessibilidade de seus temas, à feliz mistura de melodia fácil e execução virtuosística, e à simplicidade e refinamento de sua estrutura, goza de enorme simpatia entre executantes e ouvintes que preferem obras de lirismo romântico.
Os jovens violinistas da Alemanha na época não esperavam uma obra tão poética, entretanto Mendelssohn nela atingiu o ápice de sua obra concertística, apesar do seu despojamento. A estréia ocorreu em 13 de março de 1845 na “Gewandhaus” (sala de concertos em Leipzig), tendo como solista o violinista Ferdinand David (1810-1873), a quem o concerto é dedicado; em 3 de outubro de 1847, Mendelssohn pôde ouvi-lo, tocado por Josef Joachim (1831-1907). Mendelssohn, David e Joachim foram meninos-prodígios. Apesar da dificuldade de execução, a obra de Mendelssohn tem sido usada para introduzir jovens na arena da música de concerto. Certas passagens desafiam o solista a exibir sua técnica e revelar seu talento interpretativo. Desde então, o concerto deve sua popularidade ao brilho da parte solista, baseado em sua melodia encantadora; em certos casos, deve o seu sucesso à habilidade expressiva do violinista.
A força da orquestra é suavizada pela ternura do violino. Mendelssohn permite ao solista abrir o concerto, tarefa tradicionalmente atribuída à orquestra.
No primeiro movimento, percebe-se que o violinista transita com seu mágico instrumento entre os ambientes “apaixonado” e “tranqüilo”; sua substância melódica impõe-se logo no impulso inicial dado pelo violino; no segundo, surge espontâneamente uma canção; no terceiro, vislumbra-se o caráter pictórico.
Mendelssohn simplificou a obra reduzindo, em certos trechos, a instrumentação, sem perder a carga emotiva de uma linha melódica bem significativa.
Na primeira metade do primeiro movimento, a obra inicialmente exige do solista apaixonante energia; depois, o toque vai “amaciando”; para muitos ouvintes da música de concerto, é mais fácil fazer confidências com um violino; no ambiente “tranqüilo”, Carolina Frederico aos poucos vai conseguindo sutilezas no toque; na segunda metade, depois de entrar com vigor, a orquestra logo cede gentilmente a voz e a vez ao violino, para Carolina Frederico demonstrar sua serena virtuosidade; pareceu-nos aqui ter faltado maior dose de sentimento.
No segundo movimento, há oportunidade para uma melodia cantabile, várias vezes comentada pela orquestra; o violino de Carolina parece ir baixando o tom do seu assobio.
No terceiro movimento, há um diálogo amistoso entre orquestra e violino, crescentemente alegre; para os floreios de arco, há vibrações na orquestra; finalmente, o violinista deve demonstrar todos os seus dotes na técnica violinística.
Carolina possui o “physique pour jouer le rôle”. À parte alguns escorregões nos movimentos do arco, Carolina exibiu um estilo de execução tecnicamente conforme com o aprendizado, enfrentando bem uma obra muito conhecida.
Tocar com a orquestra sinfônica, no Teatro Nacional de Brasília, deve ter sido para Carolina Frederico uma excitante e enriquecedora experiência em sua promissora carreira musical.
Aos que não puderam estar presentes ao concerto de Carolina, resta a possibilidade de apreciar a maravilhosa obra de Mendelssohn numa gravação relativamente fácil de encontrar nas lojas de discos de áudio e vídeo.
Para nós, foi motivo de sadio orgulho denominacional e ocasião de raro enlevo artístico em Brasília.
(Publicado em “O Jornal Batista”, 04 fev 2007, p. 4).