Música – No. 787
O CD dos 90 anos da Capunga
(Dedicado ao leitor Ronaldo César dos Santos, de Taquaritinga do Norte, PE)
Rolando de Nassau
Nesta coluna, publicamos 19 artigos sobre eventos musicais produzidos por Batistas do Nordeste do Brasil.
O primeiro, sobre uma turnê realizada em novembro de 1955 pelo Coral “Bach”, do Recife, no Rio de Janeiro, dirigida por Geraldo Menucci, com a participação de Ana Kolb, Marta Aragão Aguiar e Jerry Smith.
Depois, comentando concertos dos coros da Igreja Batista “Sião” e da PIB da Bahia (Salvador, BA), do Seminário Batista, do Festival Coral e do Coro Misto (Recife, PE), e o recital do pianista Gamaliel Perruci.
Apresentamos, em 1988, a cantata “Para louvor e glória da Sua graça”, de Cleide Dorta Benjamin, executada no Teatro “Santa Isabel”.
Tivemos o cuidado de divulgar as gravações e publicações lançadas pe lo Seminário Batista do Recife (disco LP), pela Junta de Rádio e Televisão (fita de video) e pela JUERP (o hinário contendo hinos de Juarez Azevedo, Stela Câmara Dubois, Célia Câmara Reis, Natércia Raposo da Câmara, Nabor Nunes Filho e Miriam Ramalho; o livro “Música sempre música”, de Gamaliel Perruci; e a coletânea “Coral Sinfônico”, que revelou os compositores nordestinos Éber Bittencourt, Giovanni Heleno de Andrade Silva e Agenor Miranda Neto).
Depois de alguns anos de silêncio, cabe-nos mais uma vez o privilégio de anunciar ao povo evangélico as realizações musicais de batistas recifenses.
Presenteado por nosso amigo Ricardo Aguiar e trazido do Recife para Brasília pela jovem Ariadne Chagas Cruz, membro da Memorial, o CD dos 90 anos da Capunga, lançado em 13 de abril, é um importante documento artístico-espiritual.
No folheto do CD, o pr. Ney Ladeia escreveu: “Quem conhece a Capunga sabe de sua influência na cidade do Recife, estendendo sempre, para além de sua esfera, o impacto da música sacra a toda a sociedade, por meio de eventos, programa- ções e atividades que reconhecidamente têm deixado sua marca”.
Trabalharam para a edição do CD 120 cantores, 20 instrumentistas e coro infanto-juvenil, sob a direção do maestro Apolônio Guilherme de Ataíde Júnior.
Contribuiu para a elevação do nível do concerto o organista André Fe- lipe Menezes, à console do órgão digital “Rodgers”, inaugurado em junho de 2010. O programa do concerto constou dos itens comentados a seguir:
- “Aleluia”, trecho no. 39 do oratório “Messias”, de G.F.Haendel. Depois de uma curta fanfarra, sustentada pelos trompetes e pela percussão, a exclamação coral deve responder à orquestra. O “reino divino” é traduzido por um motivo cantado em uníssono. A idéia da eternidade (“Ele reinará para sempre”) é desenvolvida numa sólida exposição de fuga. Esta peça coral deve ser exemplo de mestria no trato dos estilos e recursos musicais. Para bem executá-la, recomenda-se um coro de 40 coristas e 30 músicos; todos alertas à gesticulação do regente, com vozes bem afinadas e instrumentos competentemente tocados. Como escreveu o crítico Bernard Holland, “A arte religiosa opera sob o princípio de que Deus quer o melhor”.
- “Aleluia, Amém!”, trecho no. 43 do oratório “Judas Macabeus”, de Haendel. Em seguida a uma ária pelo baixo solista, repetindo a letra que por este deveria ser cantada, o coro executa esta triunfante peça coral, também com o apoio de trompetes e percussão.
- “Gloria in excelsis Deo”, trecho de obra e compositor não identifica- dos suficientemente no folheto que acompanha o CD. Evenilde Veras (S), Keyla Lopes (C), Luiz Henrique Galdino (T) e Diógenes Oliveira (B) cantam em latim; tem duas partes: 1) louvor a Deus Pai; 2) louvor ao Deus Filho; a interpretação do quarteto não revelou as sutilezas deste texto litúrgico. Cantar música sacra é diferente de cantar música religiosa.
- “Louvai ao Senhor” (Salmo 150), breve peça de César Franck, empregando coro, órgão e orquestra, composta em 1888 para a inauguração de um grande órgão “Cavaillé-Coll” em Paris. Pode servir para o encerramento de uma solene cerimônia, porque há plena harmonia entre os instrumentos e as vozes. A obra religiosa de Franck é pouco importante; ele é, antes de tudo, um mestre no órgão.
- De Ralph Manuel, o Coro da Capunga ofereceu “Louvor ao Criador” e “Deus é amor”. Teria sido muito apropriada, no culto solene dos 90 anos, a execução do seu “Aleluia”, que rivaliza com o de Randall Thompson.
- No mesmo estilo, tivemos “Bênção”, de Cláudio Lysias de Melo, que se inspira na “Bênção Antiga”, de John Rutter.
- Poderia ser aproximada a cantata “As Bem-Aventuranças”, de Gamaliel Perruci, com algum trecho adequado do oratório homônimo de Franck. Assim, estariam sendo prestigiados três compositores nordestinos e seus ilustres colegas.
- Para nossa surpresa, foram incluídos também o ilustre desconhecido Demas Júnior e o seu hino “A quem me amou assim”; faltaram no folheto breves dados informativos sobre os autores e compositores participantes do CD.
- Da “prata da casa” (Áurea Paz e David Hodges) a canção comemorativa “Capunga, Igreja querida”, 10. Deixando o estilo tradicional e indo para a MCC, “Quão magnífico”, de Michael Smith, orquestrado por Sueudo Fernandes.
- “Gratidão”, de Apolônio Ataíde, em belíssimo dueto com a soprano Alice Porto Ladeia e o tenor André Damasceno, confirmado por elegante intervenção coral.
- “Tu és fiel, Senhor” – Num arranjo de Sueudo Fernandes, sob esse título, no mesmo espaço no folheto do CD, foram colocadas as letras dos hinos “Tu és fiel, Senhor” (HCC-25), de Thomas Obediah Chisholm, e “Como agradecer a Jesus?” (HCC-422), de Andraé Crouch! Desatenção aos direitos autorais!. Desserviço à hinologia!
- Um arranjador, para trabalhar no ambiente eclesiástico, não está isento do estudo da história da música religiosa, e, no mínimo, da hinologia evangélica.
Lamentamos que isso tenha acontecido justamente neste CD, veículo de disseminação da hinodia batista, circulando bem perto de uma instituição que valoriza a educação musical.
PS – Corrigimos nossa informação (OJB, 19 mai 13): Miriam Carpinetti é pesquisadora da UNICAMP, onde cursa o doutorado em música, e professora da Faculdade Mozarteum de São Paulo (FAMOSP).
(Publicado em “O Jornal Batista”, de 30 de junho de 2013, p.3)