No. 830 – O “Aleluia”, de Bach – 05 fev 17

//No. 830 – O “Aleluia”, de Bach – 05 fev 17

No. 830 – O “Aleluia”, de Bach – 05 fev 17

Doc.JB MÚSICA – No. 830

Rolando de Nassau

O “Aleluia” de Bach

(Em memória de Élben Lenz César, fundador da revista “ULTIMATO”)

Em igrejas evangélicas para muitos ministros e diretores de música, quando neles há a ambição de apresentar em solenidades e celebrações algo portentoso e impressionante em matéria de música, o recurso é executar, com maior número  de coristas e instrumentistas, o célebre “Aleluia”.

O próprio compositor, em7 de maio de 1749, por causa da presença do príncipe de Gales, coligiu partes de obras  mais recentes e acrescentou o “Aleluia”, para execução num concerto beneficente do “Foundling” (dedicado à manutenção e educação de crianças expostas e abandonadas), tendo em vis-ta a conclusão da edificação da capela desse hospital.

Nessas ocasiões excepcionais, o público presente se lembra, logo aos primeiros acordes da extraordinária peça musical religiosa de Georg Friedrich Haendel (1685-1759), do antigo costume burguês de se levantar em sinal de respeito, imitando o gesto do rei Jorge II. Deve-se pesquisar se realmente o rei es-tava presente no concerto de 19 de março de 1743 para a primeira execução do oratório “Messias” em Londres; a última ocasião na qual o rei assistiu a uma das apresentações musicais de Haendel foi cerca de 1739; além disso, nenhum crítico musical fez referência ao comparecimento do rei. Entretanto, desde 1758 os concertos em Londres mais sérios incluíam o “Aleluia” (ver: Donald Burrows, Handel: Messiah. Cambridge: University Press, 1991). O musicólogo Donald Burrows é um bem conceituado erudito, especializado na vida de Haendel e no oratório “Messias”; estudou profundamente a obra de 40 anos em Londres, onde Haendel teve contato com a capela real inglesa, durante os reinados de Ana Stuart, Jorge I e Jorge II (ver: Handel and the English Chapel Royal. Oxford: University Press, 2005).

O maestro Christopher Hogwood (1941-2014) escreveu sobre a vida de Haendel na Inglaterra (1712-1759).(ver: Handel. London: Thames and Hudson, 1988).

Às vezes o público se esquece de que Haendel quis homenagear Jesus, o grande vitorioso sobre o pecado original. O libreto do oratório, planejado por Charles Jennens, trata das profecias concernentes ao Salvador e do curso dos eventos, desde a Paixão até o triunfo da Segunda Vinda. A vitória de Jesus é celebrada pelo coro no “Aleluia”: depois de uma curta fanfarra, sustentada pelos trompetes e timbales, segue-se a majestosa exclamação do coro. Jennens interpreta Jesus como Messias e afirma suas convicções sobre a Ressurreição e a Redenção, numa época (meados do século 18) em que Anglica-nos estavam em conflito teológico com os deístas e livre-pensa-dores.

Se o ministro ou diretor de música quer evitar a mesmice e alargar o horizonte da cultura musical da congregação, então pode recorrer a compositores católicos e protestantes e-ruditos pouco conhecidos; podemos citar: Gregorio Allegri (mo-teto “Voce mea”), Joseph Boismortier (motetos “O sacrum con-vivium” e “O Rex gloriae”), Guillaume Bouzignac (moteto “Alelu-ia”), Giovanni-Battista Pergolese (moteto “In caelestibus regnis” Alessandro Scarlatti (moteto “Audi, filia”, de 1720, que talvez tenha servido de modelo para Bach), Dietrich Buxtehude (canta- ta “Also hat Gott die Welt geliebet”), Henry Purcell (antema “O praise the Lord, all ye heathen”, de 1682), John Blow (antema “God spake sometime in visions”, de 1685) e Georg-Philipp Teleman (cantata “Jauchzet, ihr Christen, seid vergnugt”).

Entre os compositores contemporâneos, podemos recomendar o “Aleluia” de Ralph Manuel, que rivaliza com o de Randall Thompson. Alguém poderá levantar uma dificuldade técnica: essas obras foram escritas nas línguas latina, alemã e inglesa; os coros de nossas igrejas não estão preparados para essa tarefa. Sinceramente cremos que haverá ministro ou diretor de música que conseguirá obviar aquele inconveniente.

Algum ministro ou diretor preferirá, ao invés da música religiosa erudita, recorrer à hinodia. Então, poderá consultar os seguintes hinários: “The Hymnal” (USA, 1982), “United Methodist Hymnal” (USA, 1989), “The Presbyterian Hymnal” (USA, 1990), “The Baptist Hymnal” (USA, 1991), “Church Hymnary” (Scotland, 2005) e “Catholic Book of Worship” (Australia, 2015).

Nesta encruzilhada, para socorrer os ministros e diretores resta-nos sugerir que executem o “Aleluia” de uma cantata sacra de Johann Sebastian Bach (1685-1750).

A cantata “Jauchzet Gott in allen Landen” (Jubilai a Deus em todas as terras – “Exult in God in every land” – BWV-51) foi composta em 17 de setembro de 1730 para ser executada “in ogni tempo” (em qualquer tempo); é um texto de louvor e agradecimento. Foi classificada como “cantata” por causa dos modelos italianos.

Aproveita o hino “Nun lob, mein Seel, den Herren”(Ó minha alma, agora louva o Senhor), de Johann Graumann, escrito em 1549; este hino encerrará também a cantata “Wir danken dir, Gott” (Nós Te agradecemos, ó Deus – BWV-29), em1731 (ver: Christoph Wolff, J.S.Bach: The Learned Musician. New York: Norton, 2013).

A execução da cantata requer uma soprano, um trom-pete e instrumentos de cordas. A parte da soprano é virtuosística; é uma brilhante peça de coloratura; o musicólogo Albert Schweitzer (1875-1965) aconselhou aos sopranos interessados na música de Bach a prática diária da ária. A parte do trompe- tista exige muita habilidade. As partes foram editadas por Matthias Wendt (Neue Bach Ausgabe, 1987) e por Belwin Mills.

No encerramento da cantata, em forma de fuga, subitamente surge um inflamado “alegro”; a soprano desenvolve um “Aleluia” (do mesmo nível técnico e artístico do “Aleluia” de Haendel) que atinge o clímax da obra. Para o musicólogo Arnold Schering (1877-1941), “há uma contínua sucessão de deliciosas surpresas”.

Acessando na internet o site https://www.youtube. com/watch?v=_OqiEmgnBpQ/  você constatará que, no meio profano, a cantata de Bach foi frequentemente interpretada pelas mais importantes cantoras (Agnes Giebel, Elizabeth Schwarzkopf, Barbara Hendriks, Elly Ameling, Edith Mathis, Lucia Popp, Helen Donath, Emma Kirkby) da cena lírica internacional no século 20.

Não temos conhecimento da execução dessa cantata, nem do referido epílogo, no meio evangélico; alguma coisa está errada.

Desde agora, devem ser procurados nas igrejas os intépretes capazes: sopranos e trompetistas com fôlego (Salmo 150, verso 6).

Esperamos que os ministros e diretores de música nas solenidades e celebrações em suas igrejas possam apresentar o “Aleluia” de Bach.

Brasília, DF, em 02 de outubro de 2016. Rolando de Nassau.

2018-02-24T12:08:57+00:00 By |Obras musicais|