Doc.JB
Música – No. 840
Rolando de Nassau
“Som do Céu” – II
(Dedicado aos leitores Manuella e Carlos Torquato, de Brasília)
Ainda no primeiro dia do acampamento da Mocidade Para Cristo (MPC), em 7 de abril de 2009, uma palestra teve como tema “A Igreja como promotora da cultura”.
Carlinhos Veiga (na época, residente no Distrito Federal), começou relembrando que “a igreja cristã no Brasil sempre enfrentou dificuldades de se relacionar adequadamente com a cultura local”( usando os parâmetros de H.Richard Niebuhr) e que “a farta produção musical dos protestantes históricos, pentecostais e neo-pentecostais é basicamente “transplantada” de outras culturas e outros contextos históricos”, para enfatizar o fato de “uma separação entre o que se produz na igreja e os assuntos do cotidiano”. Observou que foi criado “um mercado musical à parte, chamado gospel, que serve exclusivamente à igreja” … “que reproduz os valores da indústria cultural” … Citando Michael S. Horton, ressaltou o fato de J.S.Bach e F.Mendelssohn se movimentarem “entre o secular e o sagrado como esferas legítimas e divinamente ordenadas, mas não confundiam as duas”
Algo muito importante e impactante foi a constatação de Carlinhos Veiga: “o esvaziamento de conteúdo de nossas canções é resultado do esvaziamento de conteúdo dos nossos púlpitos”.
Durante o debate, ficou clara a importância da participação da igreja nas ações relacionadas à cidadania e à cultura; se a igreja “se envolvesse mais com as necessidades sócio econômicas brasileiras, abriria caminho para que fosse fortale cida uma cidadania”, e, consequentemente, “se relacionaria mais com a população brasileira”.
Para o pastor catarinense Gladir da Silva Cabral, “secularismo é, na verdade, transformar a fé em algo mercadológico”.
No segundo dia, 8 de abril de 2009, sobre o mesmo tema falou Aristeu Pires Júnior, baiano radicado em Brasília por muitos anos, transferiu-se na época para o Rio Grande do Sul.
Aristeu afirmou que alguns hinos importados no século 19 pelas missões evangélicas estrangeiras eram músicas populares; hoje, “tornou-se modelo de santidade o estilo e a forma de adoração adotado por grupos do Canadá, Austrália e Estados Unidos”. Nos anos 90, descobriu-se que “a igreja evangélica se tornou um mercado atraente e promissor”. Também surgiu o fenômeno da “levitização” dos músicos, os adoradores profissiosinais.
Entre as sugestões apresentadas por Aristeu Júnior, consideramos entre as mais importantes “investir na formação musical de crianças e adolescentes”.
Nos debates, Sérgio Pereira, presbiteriano de Ribeirão Preto (SP), observou que gravadoras “santificam” estilos para vender mais e que igrejas adotaram padronizações musicais.
Aristeu Pires Jr. assinalou que músicos profissionais perderam alguns palcos profanos e estão se dirigindo aos púlpitos das igrejas; que até emissoras evangélicas de rádio e televisão adotaram o “jabá” (pagamento pelos interessados em que suas músicas sejam transmitidas – é a “propina musical”); que tem sido fomentada nas igrejas a mediocridade.
Bomílcar, Rehder, João Alexandre e Aristeu Pires Júnior começaram suas carreiras artísticas no grupo musical “Vencedores por Cristo”. No “Hinário para o Culto Cristão” (HCC) encontramos contribuições de Bomílcar (no. 23), Rehder (no. 496) e Aristeu (no. 401). Esses hinos tiveram o condão de revelar uma modernização da Salmodia, uma popularização do relato evangélico e uma canção, que era romântica, ser convertida numa prece religiosa.
O acampamento teve um resultado positivo com a redação de uma Carta; pareceu-nos muito importante ainda na atual conjuntura “dedicar atenção e reflexão às canções que são introduzidas no culto de adoração e nas demais atividades da Igreja, evitando, de todas as formas, que heresias e desvios teológicos adentrem sutilmente em nossas comunidades”.
Em 1989 comentamos a mesa-redonda realizada na Chácara “Flora” (sede da Igreja Metodista do Brasil), com a participação de Nélson Bomílcar, Jorge Rehder e outros (OJB, 30 out 88 e 12 fev 89). Esperávamos que no Acampamento da MPC o debate tivesse sido mais diversificado e mais profundamente debatido.