Doc.JB Música – No. 801
Rolando de Nassau
Excelsior-Itacuruçá no concerto da Páscoa
(Dedicado à leitora Lúcia Demarco, do Rio de Janeiro, RJ)
À noite do sábado, 12 de abril de 2014, no templo da Praça Barão de Corumbá, na Tijuca, os coros da Sociedade Excelsior de Arte e Cultura e da igreja local reuniram-se para realizar o concerto da Páscoa.
Foi a 603ª. apresentação do “Excelsior”, desta vez sob o mote “Da cruz ao túmulo vazio”.
Tive o privilégio de assistir à primeira audição, em 08 de outubro de 1949, no salão nobre do Colégio Batista (Rio de Janeiro). Lembro que participaram os coristas pioneiros: Lúcia Demarco, Eudora Pitrowsky, Olívia Magalhães, Tamar Loureiro, Lovie Pitrowsky, Ieda de Oliveira Cardoso, Celeste Santos, Oswaldo Demarco, Beny Pitrowsky, Eliézer Lima, Jonas Esteves e Gilberto Couto.
Nestes 65 anos, o “Excelsior” tem prestado relevantes serviços à educação musical do povo evangélico.
Os coros (com 78 coristas) foram acompanhados por Eugênio Gall (organista), Ilene Marinho Riitano (pianista) e um pequeno grupo instrumental, todos sob a regência de Delci Bernardes Gonçalves.
O programa do concerto foi aberto por uma fanfarra de Francis Jackson (1917- ? ), organista (1946-1982) que sucedeu ao seu mestre Edward Bairstow na console (1913-1946) do órgão da abadia de York (Inglaterra) e destacou-se na composição de música para órgão.
Assinalando o momento festivo do “Excelsior”, esta peça musical quis enfatizar a alegria final que coroa a liturgia. Feliz Páscoa!
Como música processional, foi executada a “entrada” de Théodore Dubois (1837-1924); esta peça foi usada por Eugênio Gall para inaugurar as festas dos 65 anos.
Do oratório “Messias”, de George-Friedrich Haendel (1685-1759), foram cantados três trechos: 1) “Sobre Si” (“Surely”), quando o coro ex- pressa o martírio de Cristo e transmite a ideia da dor intensa; em som- brio tom, Haendel usa ritmos “pontiagudos”, frequentemente associa- dos às lágrimas; 2) “Por um homem” (“Since by man”), no qual Haendel faz alusão ao assassinato cometido por Caim e ao sacrifício de Jesus; 3) “Digno é o Cordeiro” (Worthy is the Lamb”), para conclusão do oratório por uma antífona Haendel serve-se de um longo trecho coral, exaltado por instrumentos de sopro, fazendo alternância entre o louvor e a enumeração dos atributos divinos. “Por um homem” foi traduzido por Heitor Argolo (1923-2008).
No oratório “Monte das Oliveiras”, Ludwig van Beethoven (1770- 1827), em sua primeira obra importante sobre um tema religioso (OJB, 14 out 84) trata Jesus como herói, tal como fizera com Napoleão na Terceira Sinfonia; foi executada algumas vezes com finalidade beneficente; “Aleluia” é um coro que contém música em forma de fuga; traduzido por Eudora Pitrowsky. Foi cantado pelo Excelsior em maio de 1956 e agosto de 1959, tendo ao piano Delci Bernardes.
Neste concerto, os acompanhistas portaram-se muito bem e foram bem recompensados pelo público.
De John Stainer (1840-1901) o coro cantou dois trechos do oratório “A Crucifixão”: 1) “Deus o mundo amou” (“God so loved the world”) e 2) “Pelo amor de Jesus” (“All for Jesus”).
Na década de 50, gostávamos de ouvir o antema “Deus o mundo amou” cantado pela Associação Coral Evangélica do Rio de Janeiro (OJB, 20 set 87), sob a regência de Levino Alcântara (1922-2014).
Em 1994, na Catedral Presbiteriana (OJB, 22 jan 95) e em 2000, na Igreja Luterana, regido por João Genúncio, o Excelsior, com 40 coristas, executou na íntegra o oratório de Stainer (OJB, 12 jun 2000).
Composto em 1886, é ouvido na sexta-feira da chamada Semana Santa de cada ano, na mesma igreja na qual teve sua estréia. Exige que os coristas estejam bem afinados e atentos aos gestos do regente.
O que sobressai nos antemas de Stainer é a magnificência de seus textos. É possível que o sucesso de Stainer seja explicado pelo fino gosto literário, numa época (1880-1900) em que a leitura da Bíblia era muito apreciada na Inglaterra.
Contemporâneo de Johann Sebastian Bach (1685-1750), o hinógrafo inglês Isaac Watts (1674-1748) escreveu o hino “When I survey the wondrous cross”; a letra é considerada a melhor na língua inglesa; foi traduzida, para o HCC, como “Ao contemplar a rude cruz”, por Werner Kaschel (1922-2010). Particularmente neste hino, Watts aplicou ao texto a sua espiritualidade pessoal; os estudiosos apontam para esse hino como exemplo de subjetividade emocional.
De Guilherme Loureiro (1916-2004), foi lembrado o coro final, “Jesus voltará”, do oratório “A dádiva de Deus”, composto em 1955; em março de 1956, foi transmitido pela Rádio Tupí (ou Tamoio?); em junho de 1956 e maio de 1959, executado na IB do Méier. É uma pena que não tenha entrado no HCC!
Finalizando a parte coral, Excelsior e Itacuruçá cantaram o hino “Vencendo vem Jesus” (CC-112, HCC-153), de Julia Ward Howe (1819- 1910), traduzido por Ricardo Pitrowsky (1891-1965), acompanhados convenientemente pelos instrumentos de sopro.
O desempenho dos coros não foi suficientemente reconhecido pelo público, cujo gosto musical tem sido embotado pelos “musicais”.
No recessional, Eugênio Gall tocou “In dir ist Freude” (BWV-615), “Em Ti está a alegria”; a música lembra o refrão de um carrilhão.
Bach recomendou a um seu aluno que procurasse o conteúdo simbólico e emocional do texto. Este conselho ainda deve valer! Neste caso, Eugênio revelou a felicidade que o compositor desfrutava na ocasião (1715-1716) em que musicou o hino, incluído no “Pequeno Livro do Órgão”.
E nesta oportunidade motivou o regozijo com que o crítico acompanhou o concerto e escreveu esta resenha.
Sexta-feira Santa, 18 de abril de 2014.