Inédito
“Louvor com sobriedade”, de Luiz Sayão
Roberto Torres Hollanda
Por intermédio da internet, lemos o artigo “Louvor com sobriedade” do teólogo Luiz Sayão, colunista da revista “Eclésia”.
Concordamos em sua observação a respeito do louvor nas igrejas contemporâneas: certos grupos (existentes também em igrejas tradicionais) usam cânticos com “forte ênfase no Antigo Testamento”, muitas vezes “sem qualquer transposição cristã”, mas com “apropriação de temas e elementos típicamente judaicos”. Igualmente concordamos que, desde a década de 60, nessas igrejas carismáticas (onde, equivocadamente, o articulista vê um cenário “litúrgico”) tem acontecido “a introdução de heresias”. Isto porque os cânticos foram escritos por pessoas sem formação teológica. Luiz Sayão dá como exemplo de “tolice” o cântico “Em espírito e em verdade”, cantado também em igrejas batistas tradicionais, apenas “porque gostam da melodia”.
Concordamos com Luiz Sayão, quando escreve que “há cânticos que não chegam a dizer nenhuma heresia – simplesmente porque não têm nada a dizer!” e quando repete um lugar-comum: “possuem bastante ritmo e algumas poucas frases, que são repetidas continuamente”.
Os grupos judaizantes e os que apóiam o uso de instrumentos da música popular no culto cristão, não obstante, receberam o respaldo da Nova Versão Internacional (NVI) da Bíblia, quando o verso 4 do Salmo 150 foi traduzido assim: “louvem-no com tamborins e danças” …
A respeito da manipulação emocional dos auditórios, em ambientes religiosos e mundanos, nós e Luiz Sayão pensamos e opinamos em termos muito próximos; ambos queremos que no louvor haja sensibilidade.
Fazemos reparos às quatro razões apontadas pelo articulista para o abandono e desuso da hinodia tradicional e a conseqüente preferência pelo cancioneiro contemporâneo.
A primeira seria a origem alienígena dos hinos tradicionais. Ora, há um grande número de cânticos (“corinhos”) que foram escritos por autores estrangeiros, tais como Zschech, Hayford, Fettke, Moen, Himitian, Kendrick, Weigle, Huston, De Shazo, Mc Hugh, Paris, Adkins, Jordan, La Porta, Red, Carpenter, Danner, King, Carmichael, Hughes, e tantos outros; e são os mais cantados em nossas igrejas, talvez por serem os mais populares nos países de língua inglesa.
A segunda seria a estranheza com que os “novos evangélicos” no Brasil, a partir da década de 60, recebiam os hinos, mais antigos do que eles, porque seus ouvidos estavam “acostumados a estilos musicais mais populares”, isto é, acostumados às músicas mundanas. Aconteceu que eles se converteram, mas não ficaram imunes aos sons profanos. O erro não estava na hinodia, mas no gosto musical dessas novas gerações de crentes.
A terceira seria o fato de certos hinos serem “maciçamente executados, gerando certo cansaço”. Então, podemos prever que os cânticos terão vida curta … Há ministros de música que, por preguiça mental, incluem nas ordens-de-culto cânticos que não têm qualquer relação com o tema do sermão pastoral, com a agravante de serem cantados repetidamente, domingo após domingo; é o canto irracional, que despreza o ensino do apóstolo Paulo (1ª. Coríntios 14: 15). Para agradar aos jovens, esses ministros incluem vários cânticos na ordem-de-culto.
Nós estamos, há muito tempo, cansados da “corinhologia” …
A quarta razão: os hinos continham “versos de difícil compreensão para os jovens”. A hinodia não tinha culpa da ignorância dos jovens, em matéria de vernáculo, embora, na década de 90, começassem a usar a linguagem do “rock” e do “software”. Em nossa adolescência, na década de 50, não tivemos qualquer dificuldade no entendimento das letras dos hinos. Luiz Sayão cita o “incipit” do hino no. 249 do “Cantor Cristão”, que diz: “Numa orgia nefanda”; qual é o jovem na atualidade que nunca ouviu falar em orgia?
Mais uma vez, Luiz Sayão labora num equívoco, quando se refere à “revolução litúrgica” das igrejas tradicionais e contemporâneas, que teria mudado o perfil evangélico brasileiro; muitas dessas igrejas nunca praticaram a sério uma liturgia; foi justamente a falta de um ambiente formal de culto que propiciou o surgimento da “onda carismática”; o rompimento da formalidade fez com que fosse abandonada a tradição musical; o desprezo pelo discernimento entre música religiosa e música profana, entre música-de-culto e música-de-entretenimento, abriu as portas das igrejas aos instrumentos antes considerados profanos (guitarra, bateria, saxofone, teclados etc.), à expressão corporal e à dança.
Sayão diz que as igrejas carismáticas aceitaram os ritmos genuinamente nacionais (samba, marchinha), porque eram autenticamente brasileiras; a Igreja Quadrangular (“Foursquare Church”) de Jack Hayford, autor do cântico “Majesty, worship His majesty” (Adorai em majestade) era uma igreja brasileira que cantava samba? É verdade que algumas igrejas batistas, consideradas “tradicionais”, estão iniciando seus membros no aprendizado do chorinho, frevo, baião, samba, bossa-nova, maracatu e outras vertentes da música popular brasileira.
A música popular, nacional e estrangeira, executada nas igrejas evangélicas teve origem ou inspiração na Igreja Anglicana e na Igreja Romana (ver: “O Jornal Batista”, 02 jan 2005, p. 4).
O articulista ressalta um aspecto que ele considera positivo: a alegria comemorativa; os tradicionais procuravam a contrição, mas os carismáticos querem festejar, pular, mover braços e pernas, dançar; a adoração meditativa dos tradicionais cedeu lugar à adoração extática dos carismáticos. Nesse ambiente informal e emocional de culto é possível o louvor com sobriedade? Os propagandistas do uso de bebidas alcoólicas aconselham: “Beba com moderação” …
Escudando-se no artigo “Louvor com sobriedade”, Luiz Sayão tornou-se o arauto de uma corrente modernista que prega o “cristianismo criativo” para abrir os templos e as igrejas às manifestações artísticas.
Timidamente, a argumentação de Luiz Sayão acaba justificando a eclesiologia, o ambiente de culto e a execução musical dos carismáticos.
– x –
(Escrito em Brasília (DF), em 25 de fevereiro de 2008)